Laboratório de Ensino
COMPLEXO DE ÉDIPO
Daniela Murta
Em "Interpretação dos Sonhos" (1900), Freud faz referência à tragédia grega "Édipo Rei". Nesta, Édipo assassina seu pai e casa com sua mãe. Mesmo tendo fugido de seu destino Édipo, é confrontado com uma verdade insuportável que lhe trouxe culpa e determinou uma autopunição.
Para o autor, essa tragédia de Sófocles comove cada sujeito humano pelo fato de figurar uma problemática que lhe é própria. Problemática que identifica nos sonhos de crianças onde aparecem desejos de morte dos pais. É por sua semelhança com o drama grego que Freud a denomina complexo de Édipo. Nele, três questões estão implicadas: a sexualidade infantil, o incesto e a culpa que implica em punição.
Freud descreve, em "Três Ensaios sobre a Teoria da Sexualidade" (1905), duas fases de organização da sexualidade anteriores ao período propriamente genital, isto é, onde a capacidade de reprodução se instala. Essas fases, chamadas de pré-genitais, caracterizam-se por modalidades específicas de prazer e modos de relação com o outro. Nesse sentido, são denominadas de fase oral e fase sádico-anal.
Em 1923, o autor postula a existência uma terceira fase, que nomeia genital, pela prevalência do prazer ligado ao órgão genital. Entretanto, afirma que, em termos psíquicos, para ambos os sexos somente há registro da existência de um órgão genital: o masculino. Eis a primazia do falo, marcada na denominação dessa fase, nomeada fálica e referida a um período capital do complexo de Édipo. Nele, para os meninos, é tempo de resolução, saída, por assim dizer, declínio do complexo. Para as meninas, ao contrário, trata-se de uma entrada no Édipo.
O menino, ao verificar ao vislumbrar a ausência de pênis nas meninas, confrontado à diferença anatômica entre os sexos, entende a mesma como resultado de uma punição. Toma forma, assim, o complexo de castração: "A falta de pênis é vista como resultado da castração e, agora, a criança se defronta com a tarefa de chegar a um acordo com a castração em relação a si própria." (Freud, 1924, p. 182).
Para os meninos, há uma retenção do primeiro objeto de amor de todo sujeito, a mãe. O pai é tomado como um rival, o menino deseja ocupar seu lugar junto à ela. Ao mesmo tempo, há a presença de uma relação afetuosa com o pai, que é base do desejo de ser tomado como objeto de amor por esse pai. Desse modo, como nos indica Freud: "O complexo de Édipo ofereceu à criança duas possibilidades de satisfação, uma ativa e outra passiva." (Freud, 1924, p. 220).
Qualquer uma das possibilidades de satisfação do complexo de Édipo implica em castração. Em "A Dissolução do Complexo de Édipo" (1924), Freud refere-se a um conflito entre um interesse narcísico no pênis e o investimento libidinal nos pais determinando o abandono do complexo de Édipo. O pai vai ser o agente da castração para o menino. "Agora, porém, sua aceitação da possibilidade de castração, seu reconhecimento de que as mulheres eram castradas, punha fim às duas maneiras possíveis de obter satisfação do complexo de Édipo, de vez que ambas acarretavam a perda do pênis - a masculina como uma punição resultante e a feminina como precondição." (Freud, 1924, p.221).
Para os meninos, a ameaça de castração é o que encerra o complexo de Édipo. Ela vai ocasionar o recalque deste, que ficará em estado inconsciente no isso, tornando-se o "núcleo da neurose". No lugar do complexo de Édipo haverá ou uma intensificação da identificação do menino com o pai ou uma identificação com a mãe: "Dessa maneira, a dissolução do complexo de Édipo consolidaria a masculinidade no caráter de um menino." (Freud, 1923, p. 47)
Nas meninas, a mãe é também o objeto original de amor. Com a descoberta de que não possui pênis, a menina, em sua fantasia, responsabiliza sua mãe por ser desprovida do órgão. A partir dessa decepção, sua relação afetuosa com a mesma enfraquece-se e a menina volta-se para o pai, que é aquele que tem o que pode lhe dar um substituto do pênis: um filho. Eis a entrada no Édipo para a menina.
Para a menina, então, que toma a castração como consumada, o interesse pelo pai funda-se numa tentativa de compensação. Deseja um filho no lugar do pênis que lhe falta. Para ela, tanto quanto para o menino, o pênis representa a posse de um poder ilimitado, poder incompatível com a própria condição do humano, por ser mortal.
O desejo de ter um filho com o pai, caro às meninas, está interditado, mas a saída do complexo de Édipo é mais complexo para elas. Freud nos fala sobre uma das saídas possíveis: "... o desfecho da atitude edipiana numa menininha pode ser uma intensificação de sua identificação com a mãe (ou a instalação de tal identificação pela primeira vez) - resultado que fixará o caráter feminino da criança." (Freud, 1923, p.47).
Tanto nos meninos como nas meninas o complexo de Édipo deixa seus efeitos, é estruturante no psiquismo de cada sujeito. A impossibilidade de satisfazer o desejo incestuoso original é ditada pela Lei -psíquica- de interdição do incesto. O supereu é o herdeiro, no psiquismo, do complexo de Édipo.
FREUD, S. Edição Standard Brasileira das Obras Psicológicas Completas de Sigmund Freud, Rio de Janeiro, Imago, 1976:
____ Interpretações dos Sonhos (1900), vol. IV.
____ Três Ensaios sobre a Teoria da Sexualidade (1905), vol. VII.
____ O Eu e o Isso (1923), vol. XIX.
____ A Organização Genital Infantil: Uma Interpolação na Teoria da Sexualidade (1923), vol. XIX.
____ A Dissolução do Complexo de Édipo (1924), vol. XIX.
____ Algumas Conseqüências Psíquicas da Distinção Anatômica entre os Sexos (1925), vol. XIX.
____ Inibição, Sintoma e Angústia (1926), vol. XX
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